Comentário de Romanos 5:1-2

Comentário de Romanos 5:1-2




Observação preliminar
Comentário de Romanos 5:1-2
O tom da controvérsia dá lugar ao estilo do nós, ou seja, a constatações comunitárias. Fala a comunidade dos que crêem. Ela está proferindo sua confissão básica, que fornecerá matéria-prima para os próximos quatro capítulos. Essa confissão não gira mais em torno do ponto da reversão libertadora, mas desdobra essa salvação para dentro da vida, e isso de forma tríplice: do estado da graça já alcançado, passando pelas aflições atuais, até chegar à esperada perfeição. A ênfase vai se transferindo visivelmente para a redenção no juízo final, pois: Tudo está bem quando acaba bem! De fato, tudo está centralizado na pergunta: Nossa vida como um todo será bem-sucedida? Somente a resposta a essa pergunta torna nossa vida plena de sentido, ou, inversamente, sem sentido. É o futuro que qualifica nosso presente. Portanto: podemos ter um fundamento para a esperança? Dito em termos bíblicos: podemos “gloriar-nos”? Esse conceito emoldura todo o trecho (v. 2,3,11). Antes abordou-se o gloriar-se falso (Rm 2.23; 3.23,27; 4.2). Agora cabe anunciar confiança verdadeira na vida.
A salvação desdobra-se para aquele que com fé firmou os passos no fundamento legal da morte de Cristo. Justificados, pois, mediante a fé, temos paz com Deus. A “paz”, na acepção bíblica, sempre tem a ver com a totalidade abrangente. O Deus que nos absolve como justos não faz nada pela metade. Tudo é colocado em ordem3. Nós o experimentamos não apenas através daquilo que nós somos e temos, mas por meio4 de nosso Senhor Jesus Cristo, enquanto espaço de graça na qual estamos firmes. Não se pode adentrar esse espaço facilmente de todos os lados, porém ele possui um acesso determinado, à semelhança, p. ex., do recinto do templo em Jerusalém. Seus portões tinham o nome de “portas da justiça” (Sl 118.19,20; Is 26.2). Somente pessoas justas podiam aproximar-se. Assim, a procissão festiva de peregrinos parava diante do portão e era submetida ao exame dos sacerdotes (Sl 15; 24). Somente quem fosse reconhecido como justo obtinha acesso ao recinto da presença divina. O cristianismo primitivo também via a sua justificação por Cristo no contexto dessa idéia. É Cristo que conduz à presença de Deusa. Sim, ele em pessoa éb nosso acesso para estarmosc na graça. O fato de que Cristo está sendo designado como Senhor faz com que o olhar se volte singularmente ao Exaltado. Ele foi nossa paz não apenas na cruz, mas também se coloca atualmente e até no juízo final como nossa garantia perante Deus e preserva para nós a paz de Deus (Rm 4.25; 8.34). Isso tudo obviamente é valido pela fé, como Paulo insere mais uma vez como premissa impreterível nos v. 1,2.
Cada pessoa corre o risco de que sua vida seja um fracasso. Porém os que crêem são tomados de confiança: e gloriamo-nos na esperança da glória de Deus. Ao tratarmos de Rm 3.27, já expusemos que a Bíblia não descarta esse gloriar-se como sendo mera vanglória. Constitui uma marca necessária da existência humana. O alvo de Deus não é o ser humano sucumbido, mas radiante, que sabe vencer e um dia de fato estará coroado de vitórias (Rm 8.37). Como o ser humano se torna vencedor? Ele brilha quando Deus brilha. Um dia, quando “o reino e o poder e a glória” forem definitivamente de Deus, isso também significará a glorificação concomitante de todos os que estão em Cristo (Rm 8.17,30; Fp 3.21).




3 Paulo aproxima-se novamente das passagens centrais de Isaías: Is 45.7; 48.18,22; 52.7; 54.10; 57.18,19. Em termos lingüísticos, a palavra hebraica para “paz” (shalom) contém “unificar”, “completar”, “transformar numa totalidade intacta”, reunir o que cumpre manter junto. É nesse sentido que “paz” se tornou um termo condutor da primeira igreja, p. ex., em Rm 1.7; 8.6; 14.17,19; 15.13,33; 16.20.
4 Esse “por meio de Cristo” ocorre 34 vezes em Paulo, p. ex., no trecho sob análise, ainda nos v. 2,9,10,11.
a Ef 2.17-20; 3.11,12; Hb 2.10; 4.16; 9.8-12; 10.19-22
b Jo 14.6
c 1Co 10.12; Gl 5.4; 1Pe 5.12; 2Pe 3.17,18